Mudar o regime Servir Portugal

Manuel Beninger

terça-feira, 4 de setembro de 2012

EM 1949, BOTELHO MONIZ PROPÕE NA ASSEMBLEIA NACIONAL QUE SE TERMINE O BANIMENTO DO TERRITÓRIO PORTUGUÊS IMPOSTO AO CONDE DE OURÉM, D. DUARTE NUNO DE BRAGANÇA

Na sessão de 24 de fevereiro de 1949, o deputado Botelho Moniz apresentou um projeto de lei que visou por termo ao banimento do território português de D. Duarte Nuno de Bragança e sua família. Tratava-se de uma lei promulgada em 1834, na sequência das guerras liberais, a qual obrigava ao exílio o rei D. Miguel e seus descendentes, tendo a partir do estabelecimento do regime republicano sido alargada a todos os ramos da Casa Real. A Assembleia Nacional veio em 1950 a revogar a referida lei, tendo D. Duarte Nuno de Bragança, Duque de Bragança e Conde de Ourém, regressado a Portugal em 1952.
Transcreve-se do Diário das Sessões a intervenção do deputado Botelho Moniz respeitando-se a grafia da época.
O Sr. Botelho Moniz: - Sr. Presidente: um seguimento a considerações que produzi antes e durante a última campanha eleitoral, e como sua consequência inevitável, vou entregar a V. Ex.ª, dentro de alguns minutos, um projecto de lei que reputo representar um primeiro passo no sentido da conciliação da família lusitana.
Creio que o artigo 3.º deste documento só encontra perfeitamente de acordo com o sentido de uma moção que, em sessão legislativa anterior, tive a honra de ver aprovada, por unanimidade, pela Assembleia Nacional.
Por sua vez, os artigos 1.º e 2.º desse projecto concedem amnistia completa para as faltas disciplinares e crimes políticos cometidos por pessoas cujos altos serviços à Pátria tenham merecido galardão especial. Os artigos 3.º e 6.º pretendem reparar algumas injustiças e desigualdades flagrantes.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Botelho Moniz: chamo a atenção de V. Ex.ª para a disposição regimental que não permite anunciar-se qualquer projecto de lei sem prévia observância do § 1.º do artigo 11.º do Regimento.
O Orador: - Conforme declarações públicas amiudadamente formuladas, sou partidário de uma amnistia geral, de que beneficiem monárquicos e republicanos condenados por crimes exclusivamente políticos.
No entanto, o meu projecto de lei é muito mais limitado. Porquê? Porque nos encontramos a menos de dois meses do início de novo período presidencial e me parece que só ao Poder Executivo compete ser juiz da oportunidade duma amnistia de tão grande vastidão, naturalmente condicionada pelas emergências políticas e pela atmosfera em que a vida pública se desenvolver. Se esta primeira étape obtiver aprovação da Assembleia, aplaudirei de todo o coração as decisões mais largamente generosas que o Chefe do Estado e o Governo entenderem por bem tomar.
O artigo 3.º do meu projecto visa a colocar em situação de igualdade com os amnistiados alguns portugueses de alto valor pessoal e profissional que viram as suas carreiras militares destroçadas por motivo de ferimentos em combate e os seus direitos legais diminuídos como efeito de aplicação demasiado genérica de disposições retroactivas.
O último artigo pretende terminar com uma desigualdade tão odiosa que foi condenada, em duas notas sensacionais, pelo próprio órgão pessoal de S. Ex.ª o ex-candidato oposicionista.
Refiro-me ao banimento do território português do Sr. D. Duarte Nuno de Bragança e de sua família. Nenhuns outros exilados existem, legalmente ou forçadamente.
Como republicano, educado em princípios de tolerância e igualdade, repugnam-me todas as leis de excepção.
Como português, julgo que Portugal não tem o direito de continuar negando esta reparação elementar ao nobilíssimo e abnegado representante da dinastia de Bragança, à qual a Pátria deve a salvação da sua independência, a conservação de grande parte do seu Império e muitos séculos de civilização cristã, de progresso da grei e de paz social.
Propositadamente apresento este projecto de lei sem haver consultado quem quer que seja. Trata-se de uma iniciativa individual cuja responsabilidade me pertence ùnicamente.
Entretanto, ao terminar estas considerações, julgo útil narrar ura pequeno episódio: há dias, no decurso de conversa com um republicano ilustre da oposição, embora não entrasse em pormenores ou pedisse opiniões, anunciei-lhe a minha intenção de pugnar pela revogação do banimento da família real portuguesa. Disse-me achar justa a medida, sob condição de que o pretendente ao trono não efectuasse propaganda dos seus ideais políticos.
Respondi-lhe simplesmente: porque há-de um português monárquico ter direitos inferiores aos que a oposição republicana pede para si?
O meu interlocutor, pessoa muito culta, inteligente, sincera e compreensiva, meditou um instante, sorriu e respondeu-me em duas palavras: tem razão.
Nenhum outro apoio ou comentário poderia ser mais expressivo.
Em vista da advertência de V. Ex.ª, o meu projecto de lei vai ser entregue na Mesa para seguir os trâmites regimentais.
Tenho dito.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O orador foi cumprimentado.
(Foi mandado para a Mesa o projecto).
O Sr. Presidente: - Nos termos do Regimento, o projecto do Sr. Deputado Botelho Moniz vai ser submetido à apreciação das comissões respectivas, que terão de pronunciar-se sobre a sua conveniência ou inconveniência, se antes não for afastado por inconstitucionalidade, e só então o Sr. Deputado Botelho Moniz poderá fazer a sua apresentação à Assembleia.

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