terça-feira, 10 de julho de 2012

"Como ser dois sendo um? Como ser um sendo dois?", por Sílvia Oliveira

Satisfação conjugal é, sem dúvida, um conceito subjectivo que implica ter as próprias necessidades e desejos satisfeitos, assim como corresponder, em maior ou menor escala, ao que o outro espera, definindo um dar e receber recíproco e espontâneo.
Não há dúvidas que a competência do casal depende da qualidade das relações estabelecidas entre os conjugues, relações essas que se transformam ao longo do ciclo de vida conjugal.
Mas, também é verdade que toda a dificuldade de ser casal encerra ao mesmo tempo, na sua dinâmica, duas individualidades e uma conjugalidade, ou seja, um casal contem dois sujeitos, dois desejos, duas inserções no mundo, duas percepções do mundo, duas histórias de vida, dois projectos de vida, duas identidades individuais que na relação amorosa convivem com uma conjugalidade, um desejo, uma história de vida conjugal, um projecto de vida de casal e uma identidade conjugal.
Então, como ser dois sendo um? Como ser um sendo dois?
Uma condição essencial para o casal é a adaptabilidade, que tem relação com o equilíbrio entre a manutenção de uma estrutura estável e ao mesmo tempo flexível, com regras claras e susceptíveis de serem negociadas e até modificadas, em resposta às mudanças da vida, que hoje, são muitas e muito rápidas.
Um outro requisito fundamental é a expressão das emoções que funciona como aspecto vital da comunicação de casal e que se relaciona com sensações e sentimentos de bem-estar, contentamento, companheirismo, afeição e segurança, factores que propiciam intimidade no relacionamento, decorrendo da congruência entre as expectativas e aspirações que os cônjuges têm e a realidade vivenciada no casamento.
E, nesta continuidade é importante considerar, também, a liderança partilhada, ou seja, a reciprocidade e equilíbrio de poder entre o homem e mulher, pois quando o desequilíbrio persiste leva a relação à insatisfação, a sintomas de fadiga, à diminuição no desejo sexual e até depressão, mais frequente na mulher devido à carga desproporcional de responsabilidades.
Também a coesão é um factor de protecção, integridade e prevenção da ruptura do vínculo. Os casais saudáveis conseguem encontrar um equilíbrio entre proximidade e respeito ao distanciamento e às diferenças individuais. Note-se que nos casamentos tradicionais, espera-se que as mulheres sacrifiquem a satisfação das necessidades pessoais e de relação, à carreira do marido, nestes casos, se alguma coesão é mantida é obra quase exclusiva da adaptação da esposa às prioridades do companheiro. Situação bem diferente das relações actuais em que ambos se empenham na execução dos compromissos de trabalho e família, sofrendo o relacionamento de falta de espaço para o próprio casal e para cada um individualmente.
Independentemente das condições apresentadas serem importantes na vida do casal, a resolução de problemas é das situações mais essenciais para o ciclo vital do casamento. A grande diferença dos casais que dão certo e os que não dão certo, não é a presença ou ausência de problemas, mas sim a capacidade de enfrentar e resolver as dificuldades que surgem na vida a dois. Mais, enquanto no casamento tradicional as regras da relação são claras e até congruentes com a própria família e com a comunidade, retirando-se disso modelos e apoio, nos casais não tradicionais, experimenta-se um tipo de mudança descontínua que muito dificulta a resolução dos problemas vividos. Assim, surgem armadilhas sucessivas que sem resolução à vista caminham para a ruptura de relações que tudo teriam para dar certo. Neste propósito estão, também, os casais com baixa tolerância ao conflito que por isso mesmo, tendem a não exprimir as diferenças, por medo que o conflito aumente e ocasione violência ou ruptura, tendendo nessa continuidade a concordar com tudo, para se libertarem do fracasso ou da culpa. Também existem aqueles casais que caiem em armadilhas de “quem tem razão e quem não tem”, sem qualquer capacidade de considerar o ponto de vista do outro. Uma outra situação que merece todo o cuidado na relação do casal é o evitar os conflitos, pois a sua prática leva a segredos na vida a dois. Nestes casos, os conjugues tem por hábito ver o companheiro(a) como uma parte inseparável da sua própria identidade e existência, considerando intolerável qualquer conflito que possa ameaçar o seu relacionamento, sendo pois este comportamento que leva os aspectos conflituantes a ser escondidos ou até resolvidos fora do casamento, mantendo-se o relacionamento rígido, estável e ilusório, baseado mais na função que na satisfação mútua das necessidades reais. Outra situação é os anos de conflitos abertos e não resolvidos ou os falsos casais que aparecem felizes em público, mas que desenvolvem por trás dessa aparência mecanismos sofisticados para encobrir os buracos da sua relação, sendo a maior parte das vezes casamentos mantidos pela crença na família e não pelos laços emocionais entre os conjugues. Esta incapacidade de interacções eficazes e criativas para resolver os problemas dentro de uma relação, deixa insatisfeitas necessidades pessoais e relacionais, sustentando um estado de bloqueio e de estagnação que leva os cônjuges a não saber como mover-se para dar o primeiro passo, perdendo com isso o potencial curativo da própria relação.
Em forma de termo importa deixar registado que casais satisfeitos conseguem manter fortes laços emocionais com seu cônjuge, mudar a estrutura de poder, de papéis e de regras no seu relacionamento ao longo da vida conjugal e em face de situações de crise, assim como, desenvolvem padrões de comunicação adequados, o que é considerado essencial para a satisfação conjugal de ser amado, respeitado, sentir-se seguro, compartilhar desejos e sonhos, ter suas necessidades físicas, emocionais e espirituais satisfeitas, bem como, ter a possibilidade de dividir tudo isso com alguém especial ao longo da vida.
Sílvia Oliveira
Deputada Municipal pelo PPM na Assembleia Municipal de Braga
Jornal "Diário do Minho" de 7 de Julho, pág. 21

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