Retomando o tema do Projecto da
ex-Autoridade Florestal Nacional (AFN) referente à reflorestação, envio um
artigo de grande interesse da autoria da Professora Doutora Helena Freitas, da
Universidade de Coimbra, publicado no Jornal "Diário de Coimbra"
no pretérito dia 31 de Julho.
Repare-se que o discurso vertido no artigo supra citado aponta para o perigo que esta proposta da ex-AFN (hoje,
ICNF) representa para o ordenamento florestal nacional e para os solos (a
que se acrescenta o despovoamento do interior do País)..
É mais um contributo, deveras importante, vindo da comunidade científica.
Júlio Reis Silva
P.S. - Após o artigo, segue uma breve nota curricular da sua autora.
Os senhores da floresta
Vem este texto a propósito da nova proposta de alteração do regime que
regulamenta as acções de arborização e rearborização com espécies florestais,
documento que a Autoridade Florestal Nacional preparou e colocou recentemente
em apreciação pública. Qualquer cidadão atento aos problemas do território, em
especial ao despovoamento do interior e às actividades que ajudam a ...
contrariar esta tendência, como sejam a floresta diversa e a agricultura,
não pode deixar de se indignar com esta proposta. Na minha opinião, trata-se de
uma iniciativa legislativa que ameaça a sustentabilidade do território
nacional, castigando em particular o desenvolvimento das regiões norte e
centro, pelo que deve ser abortada ou reprovada por quem ainda o pode fazer.
A proposta é extemporânea e insensata, correspondendo a uma clara e
indecorosa intenção de beneficiar uma das fileiras associadas à floresta
portuguesa. Nesta análise, limito-me a identificar dois aspectos críticos
essenciais no documento: 1. a
abertura que a legislação introduz para arborizar com espécies florestais de
qualquer tipo (deixando de haver distinção entre as chamadas espécies de
crescimento rápido e as outras) em parcelas com área inferior a 5 ha , isto é, não será
necessária licença prévia, nem sequer em áreas de regadio; 2. abre a
possibilidade de rearborizar alterando a composição das espécies florestais em
áreas com dimensão superior a 10
ha , uma vez que admite o deferimento tácito se os
serviços não responderem no prazo de um mês (não sei se alguém acredita
seriamente na bondade desta disposição). Ou seja, estamos a proscrever a
interdição para alterar a composição em áreas afectadas pelos incêndios,
condição que tem contido a ocorrência de embustes.
Não é segredo para ninguém que a floresta portuguesa é dominada por 3
espécies - o eucalipto (1º), o pinheiro (2º) e o sobreiro (3º) – e à volta
destas espécies, foram-se desenvolvendo as principais actividades económicas
associadas à floresta em
Portugal. A região centro do país habituou-se ao eucalipto e
ao pinheiro, sendo que, este último, é para muitas pessoas a espécie que as
populações acarinham e reconhecem como símbolo da sua paisagem e da sua região.
O eucalipto, é sobretudo uma opção para aqueles que gerem a propriedade –
directamente ou por interposta entidade - com o propósito de garantir uma
receita legítima. Embora não esconda que preferia ver o território nacional
florestado com espécies nativas, cuja biologia melhor se inscreve numa relação
equilibrada com outras espécies e com as condições ecológicas dos nossos
ecossistemas, reconheço a importância económica da fileira do eucalipto, que ainda
representa uma matéria-prima relevante para a economia nacional. Todavia, tal
não significa que se tenha que aumentar a área útil destinada à implantação
desta espécie! A que existe chega bem, bastando optimizar a gestão e a
produtividade das respectivas plantações.
A expansão do eucalipto na região centro far-se-á necessariamente à custa
de áreas de pinhal e áreas abandonadas com aptidão agrícola. Numa altura em que
a fileira do pinheiro – mais desorganizada e mais diversa nas ofertas do
mercado – está seriamente fragilizada pelo impacto da doença do nemátode, fica
o caminho ainda mais facilitado. É conhecida a crescente valorização comercial
do pinheiro nos mercados externos, pelo que a competição entre estas duas
fileiras é agora mais evidente. Não pretendo aduzir argumentos à contenda, mas
não tenho dúvidas que se a região centro aumentar a área de eucalipto em
prejuízo do pinheiro, favorecerá a tendência para o despovoamento do interior,
e terá que se preparar para a perda de outras actividades associadas ao
território que não são compatíveis com a presença do eucalipto. A proposta que
se pretende aprovar, vem somar fragmentos contínuos ao grande eucaliptal que já
temos; é um absurdo que urge denunciar e contestar.
Helena Freitas, Diário de Coimbra (30 de Julho de 2012)
Prof. Doutora Helena Maria de Oliveira Freitas
Informação curricular:
Helena Freitas doutorou-se em Ecologia pela Universidade de Coimbra em 1993
e realizou um pós-doutoramento na Universidade de Stanford, EUA, em 1994/95. É
actualmente Professora Catedrática do Departamento de Ciências da Vida (DCV) da
Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra, cujo Conselho
Científico integra, e Directora do Jardim Botânico. Foi membro do Conselho
Geral da Universidade de Coimbra.
Foi Presidente da Liga para a Protecção da Natureza entre 1999 e 2002 e
primeira Provedora do Ambiente e Qualidade de Vida de Coimbra (2002-2005). É
actualmente Presidente da Sociedade Portuguesa de Ecologia e Vice-Presidente da
Federação Europeia de Ecologia. É Coordenadora do Centro de Ecologia Funcional,
uma unidade de investigação interdisciplinar no âmbito das Ciências Biológicas,
centrando as suas áreas de interesse no estudo do funcionamento dos
ecossistemas mediterrânicos, biodiversidade, interacções bióticas, ambiente e
conservação da natureza.
Eu já disse que eucalíptos, NÃO!
ResponderEliminarNegligência e ignorância a juntarem-se em mais uma triste calamidade neste meu Portugal.
os Eucaliptos são uma praga na nossa floresta.. vão dar cabo dela com estas leis que da logo para entender que não conhecem a realidade do país.. só conhecem a realidade das cadeiras e gabinetes.. enfim..
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