Eu não sou Monárquico!
Na babilónia de ideias e de conceitos do actual debate “República versus
Monarquia”, eu quero afirmar aqui, sem qualquer subterfúgio, que não sou
Monárquico!
A Monarquia terminou em 1820 e não a quero de volta. E não quero também
de volta a Monarquia que lhe sucedeu, a chamada “Monarquia Constitucional”,
derrubada em 1910. Vivo bem, e creio que os meus concidadãos também vivem bem,
sem a verídica Monarquia do século XVIII e sem a Monarquia com alcunha do
século XIX.
Sou pela República! Sou republicano! Sou aliás visceral e radicalmente
republicano!
A República ( Res publica ou Coisa pública) tem, entre nós,
uma longa e nobre tradição, bem viva antes do século XVIII. É com essa Tradição
que me identifico.
Eis o que nos diz Duarte Nunes de Leão na “Crónica del-Rei D. Fernando”:
“em cortes que para isso ajuntou fez algumas leis muito úteis à república, e
naqueles tempos muito necessárias.”
Na orientação que traçou para o seu reinado, escreveu o rei D. Sebastião
numa das suas “Máximas”: “Gavar os homens, e cavaleiros que tiverem bons
procedimentos, diante de gente, e os que tiverem préstimo para a República e
mostrar aborrecimento às coisas a ela prejudiciais”.
Depois da Restauração de 1640, exarou o Doutor Vaz de Gouveia na “Justa
Aclamação”: “o poder dos reis está originariamente nos povos e nas repúblicas,
que delas o recebem por forma imediata.”
Não julgo ser necessário alongar aqui as citações comprovativas da
República portuguesa ao longo dos séculos, mas cumpre lembrar que foi quando as
Cortes deixaram de reunir, no século XVIII, que começou a haver cada vez mais
Monarquia em Portugal.
Depois, a temática política do século XIX tratou de inventar o
antagonismo, colocando, de um lado, os chamados “monárquicos” e, do outro, os
chamados “republicanos”. Os primeiros diziam defender o Rei, os segundos
defender a Res publica. Estava instalado um pernicioso divórcio. Em abono da
verdade, os republicanos tinham motivo para classificar os seus adversários
como monárquicos. Não eram outra coisa ou, melhor, eram apenas isso. Pouco lhes
importava o bem da Res publica, da Coisa pública. Quando o republicanismo se
tornou consciente e organizado, os seus adversários, se bem que adoptando a
alcunha de constitucional, aceitaram de bom grado a qualificação de
monárquicos. Diziam defender o Rei e era, com efeito, à sombra do poder do
monarca, à sombra do suposto “poder de um só”, que eles usufruíam das benesses
do poder do Estado. E foi só quando o Rei D. Carlos se opôs à rapina que a
coisa deu para o torto. Por isso o mataram e, depois de derrubada a Instituição
Real, só às atenções mais distraídas causou escândalo a adesivagem em massa que
os ditos monárquicos fizeram à novel “República”. Tinha sido feita uma mudança
de tabuleta na mesma droga e não foi difícil abrigarem-se nela. Estamos nisto
vai para mais de um século.
Hoje, o que me separa de um “soi-disant” republicano, mas de um
republicano que queira mesmo o bem da República, é fundamentalmente isto: ele
quer para a República um presidente eleito; eu quero que a República remate
pela chefatura dinástica de um Rei. Ele defende a Presidência da República; eu
defendo a Instituição Real na chefia do Estado.
Eu não sou Monárquico; sou Realista!
José Manuel Quintas
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