Henrique de Paiva Couceiro
Como dizia o grande Solnado, “palavra puxa grunhido, grunhido
puxa palavra”, e a verdade é que continua a vir-me à cabeça a estadia em Lisboa. Até parece que
foi a primeira vez que ali estive. Mas...
Ficámos num hotel na rua Castilho, como já contei, com uma bela vista
sobre parte de Lisboa, e à noite demos ali à volta alguns passeios a pé.
Fui ver, por fora, a casa em que morei com os meus pais aí por 1936, uma
esquina da rua P. António Vieira com a Rodrigo da Fonseca e no cimo da rua
Castilho a ex-Cadeia Penitenciária, abandonada, que, em Dezembro de 2006, foi
alvo duma inescrupulosa vigarice do (des)governo do sr. sócrates, quando pensou
que todos os portugueses eram burros e vendeu a Penitenciária, do Estado, a uma
pseudo empresa pública, do Estado, para tentar esconder o descalabro que desde
há muito vinham apresentando as contas públicas. E parece que até hoje ninguém
sabe o que fazer com aquele complexo, mas que vai dar, ou já deu, uma grande
negociata, com os amigalhaços, disso ninguém tenha dúvida. Enfim! Depois
descontam nos trabalhadores e aposentados!
Mas voltemos à Penitenciária, desta vez em 1919!
Nessa altura alguns monárquicos ainda sonhavam com a restauração da
monarquia, e houve uma revolução. Foi a chamada “Monarquia do Norte” comandada
por Paiva Couceiro, uma das grandes figuras da história de Portugal do final do
século XIX. Uma revoluçãozinha. À moda portuguesa.
Em Lisboa a revolução foi liderada por Aires Dornellas e João de Azevedo
Coutinho, outros dois heróis nacionais, monárquicos até à medula, mas não durou
mais do que cinco dias! Capitularam perante os republicanos e foram todos
“engavetados” nesta Penitenciária.
Eu tenho um livro de autógrafos, que foi do meu bisavô, e que entrou na
Penitenciária, até porque também fora preso um sobrinho do meu avô, e é hoje um
prazer ler as assinaturas de quase todos os oficiais envolvidos, muitos deles
antepassados de amigos e até mesmo de alguns dos meus netos!
Todos, por baixo dos seus nomes, acrescentaram “ex-T.Cel. de
Artilharia”, ou “ex-Cap. de Cavalaria”, etc., e muitos deles ainda escreviam
“na Cadeia Penitenciária”!
E lá vêm os nomes:
- João de Azevedo Coutinho – Penitenciária de Lisboa – Dia da Paz – 12
Julho 1919 (nesta altura ainda Capitão de Fragata porque se retirara da Marinha
na implantação da República!)
- Ayres d’Ornellas – Penitenciária de Lisboa – 12 Julho 1919
- João de Vasconcellos e Sá – ex-major de Cavalaria – Penitenciária... –
18/7/919
- Álvaro César de Mendonça – 12-VII-919
- Augusto Mateus (?) da Costa Veiga – Te.Cel.Eng. ... ?
- Alberto de Almeida Teixeira – ex-Tenente Cel de Artª, com.te do grupo
de artª ... ?
- Carlos Maria Sepulveda Velloso – Ex-Com.te do G.E. de L.N (?)
- Antonio Lobo de Portugal e Vasconcelos – ex-cap. de cav. da guarda
- Hermillo Pereira Prostes da Fonseca – cap cav.
- Guilherme Street d’Arriaga e Cunha (Carnide) – ten mil. d’Engª
- João da Cunha Monteiro – te.te milº d’artª a pé
- José Ferreira Lima – of. demitido do reg.to de cav. 4
- Theofilo Duarte – ten. cav. 7
- José Manuel Figueira Freire – capitão de cavalaria
- Jaques...(?) Sena ... (?) – alf. m. d’arta
- Antonio Augusto Parreira – ex-Capitão de Lanceiros 2
- Antonio Lobo Antunes – Capitão de Cavalaria
- Conde de Arrochella – ex deputado por Lisboa
- Fernando Cortez (?) Sampayo e Mello –
- José (Madeira ?) de Almeida
- José Augusto (?) de Almeida
- Gonçalo Casimiro Murgueira
- Jorge Ribeiro
Onde está (?) é porque não se conseguiu decifrar correctamente o nome
intermédio na assinatura.
E aqui está uma lista dos monárquicos... perdedores, que algumas semanas
mais tarde seriam amnistiados. Alguns decidiram exilar-se e só voltaram a
Portugal depois que foi declarada a amnistia geral, em 1925.
A João de Azevedo Coutinho foram-lhe mais tarde reconhecidas todas as
suas acções militares e administrativas, reintegrado na Marinha e promovido a
vice Almirante honorário.
Todos estes passeios por Lisboa trazem memórias, sem esquecer as
“Quentes e boas”, aquelas maravilhosas castanhas assadas embrulhadas em
higiénico papel de jornal (!), que nesta época do ano se vendem nas ruas de
Lisboa, e quando eu era jovem custava, cada embrulhinho, cinquenta centavos ou
um escudo e agora custam um euro! Só 200 vezes mais!
Rio de Janeiro, 19-Nov-10
Francisco Gomes de Amorim
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