A família real esteve exilada desde
1834 e só foi autorizada a regressar a Portugal em 1950.
Duarte, da parte do pai, e Pio, da parte do padrinho, o Papa Pio XII.
Dom Duarte Pio, Duque de Bragança, nasceu no estrangeiro, mas em território
português: "Pela lei da monarquia só pode ser Rei de Portugal alguém que
nasceu em Portugal e que seja português. Para assegurar essa hipótese, os meus
pais conseguiram que a minha mãe ficasse instalada na Embaixada portuguesa, em
Berna, e foi lá que nasci". A Família Real esteve exilada desde 1834
"após a vitória do exército liberal que invadiu Portugal e que derrotou o
exército português e exilou o Rei Dom Miguel". Mais tarde, em 1910,
"foi o exílio de Dom Manuel II". Apesar da Família Real ter demonstrado,
por várias vezes, vontade de regressar a Portugal, só teve autorização para o
fazer em 1950: "A Assembleia Nacional tinha bastantes deputados
monárquicos. O governo não queria retirar o exílio, mas o grupo de deputados
monárquicos lançou a proposta e acabou por ganhar".
O regresso só aconteceu três anos depois porque, apesar do governo ter
aceite, ia dizendo "não venham já". Dom Duarte tinha oito anos quando
chegou a Portugal e recorda com "grande emoção" os "três ou
quatro dias de viagem de carro": "Tenho outra experiência menos
agradável! Quando chegámos a Gaia, fomos comidos pelos mosquitos nas primeiras
noites e a minha mãe foi buscar o véu do vestido de noiva e transformou-o num
mosquiteiro para cobrir as nossas camas."
Ficaram "muitos anos" instalados na Quinta da Boavista, em Vila Nova de Gaia,
propriedade da Condessa da Covilhã, porque não tinham onde ficar: "Quando
o Rei Dom Manuel II morreu, o Estado expropriou as nossas propriedades de
família e transformou-as numa Fundação". Mais tarde, "por instruções
do governo, a Fundação passou a pagar uma quantia" à Família Real "e
arranjou uma casa perto de Coimbra": "Era um antigo convento que foi
restaurado e que o meu pai achava muito pouco prático porque gastava-se muito em aquecimento. E a
minha mãe sofria muito com o frio porque era brasileira e não estava
habituada."
Apesar de já estar em Portugal, aos olhos dos regimes vigentes, era como
se a Família Real não existisse: "O meu pai e eu, em particular, fomos
convidados para alguns actos oficiais. Mas havia cenas cómicas como, por
exemplo, eu estava numa missa oficial ao lado da mulher do presidente da
república, o Almirante Américo Tomás, e tiveram o cuidado de cortar a minha
presença na foto."
O interesse pela agricultura levou Dom Duarte a escolher um curso de Engenharia
Agrónoma, que teve de interromper para seguir outra paixão: "Queria ir
para piloto desde criança e interrompi o curso para ir para a Força
Aérea". Passou três anos e meio em Angola, que descreve como "uma
experiência muito bonita", fez amigos, mas depois, teve "um
azar": "um ministro da Defesa, muito fanático republicano, proibiu
que eu voasse por razões políticas". Trocou o helicóptero por uma mota e
passou a viajar pelo interior de Angola para perceber "os descontentamentos
que havia". O governo português só ficou "muito zangado já no tempo
de Marcello Caetano" porque Dom Duarte organizou uma lista da oposição
"constituída, sobretudo, por candidatos angolanos" para as eleições
do Parlamento português de 1972. Dom Duarte garante que "a lista estava
muito bem encaminhada", mas acabou por ser expulso de Angola porque
"o Governo de Marcello Caetano tinha um projecto secreto de independência
em conjunto com os Estados Unidos e com África do Sul".
Estava no Vietname do Sul, quando recebeu um telefonema do Presidente do
Parlamento a dizer: "Os seus ganharam". Era o 25 de Abril de 1974.
Dom Duarte de Bragança acredita que
“nunca teríamos chegado a esta situação de falência fraudulenta” com uma
Monarquia.
Está em vias de ter tripla nacionalidade, mas é em Portugal que gostaria
de reinar. Em entrevista ao "Conversas com Vida" do ETV, Dom Duarte,
duque de Bragança, acredita que poderia colaborar mais com o actual Governo e
garante que "90% dos filiados no CDS são monárquicos"
O jornal "El Pais"
caracterizou--o como "um Rei sem reino". É assim que se sente?
- Não. Eu sinto-me representante de uma História, de uma dinastia, de
uma memória política e um português à disposição dos portugueses para o que for
preciso. Se quiserem a minha presença como Chefe de Estado, estou disponível,
mas há outras coisas que também posso fazer e tenho feito. E acho que o Estado
português poderia ter utilizado muito mais as minhas possibilidades de acção.
Colaborei com os governos portugueses na solução do caso de Timor, nas relações
com a Indonésia, na Guiné-Bissau e em Angola, nas relações com o mundo árabe...
Tenho tido acções que tento coordenar com os vários ministros dos Negócios
Estrangeiros.
Mas continua a ser consultado pelos
vários ministros dos Negócios Estrangeiros?
Actualmente, não tem acontecido. Mas com os ministros de Durão Barroso,
Jaime Gama, houve bastante colaboração, em particular, em relação a Angola e
Timor. E o Parlamento timorense, muito amavelmente, reconheceu que foi em parte
graças à minha intervenção que se resolveu a ocupação indonésia e tiveram um
gesto simpático que foi darem-me a nacionalidade timorense com passaporte
timorense. Estou em vias também de passar a ser brasileiro porque a minha mãe
era brasileira e a presidente Dilma Roussef confirmou que gostava muito que eu
fosse brasileiro.
Mas porque é que acha que os
ministros dos Negócios Estrangeiros não pedem a sua colaboração?
- Não tem havido ocasião para isso.
Mas acha que podia dar um contributo
relevante para a diplomacia portuguesa?
- Em alguns casos, sim. Há países com os quais a situação é
complicada, como a Guiné-Bissau, onde me dou muitíssimo bem com todos os grupos
políticos e chefias tradicionais e chefes de tribo... Já ofereci a minha ajuda
ao Dr. José Ramos Horta que vai agora como delegado especial das Nações Unidas
para a Guiné... Fui duas vezes à Síria a pedido do Presidente da República e
alguns membros da oposição... E chegámos a acordo, mas só não foi posto em
prática porque há um movimento islamista radical.
No actual momento de crise, uma
monarquia poderia dar um contributo diferente ao país?
- Estou convencido que uma das razões porque em quase todas as
Monarquias, talvez com a excepção de Espanha, não há uma crise financeira grave
como temos em Portugal é porque, de algum modo, os Reis e as Rainhas, como são
completamente independentes e não têm ligação aos partidos políticos, são
escutados e aceites por todos os lados. No caso da Bélgica, da Rainha da
Dinamarca, do Grão-duque do Luxemburgo eles colaboraram muito para que a
oposição e o governo evitassem entrar em situações perigosas.
Quer dizer que Dom Duarte poderia
ser uma peça importante no consenso político em Portugal?
- Provavelmente, nunca teríamos chegado a esta situação de falência
fraudulenta se tivesse havido um supremo juízo que pudesse controlar os desvios
e exageros dos governos. Por outro lado, há o problema da corrupção. Segundo um
programa da BBC, se a corrupção em Portugal tivesse sido controlada, estaríamos
ao nível económico da Dinamarca porque perdemos, no mínimo, 10% do PIB com a
corrupção. É fácil de perceber que, se tivéssemos poupado esses 10%, não
estaríamos onde estamos hoje. E a corrupção não é só o dinheiro desviado é,
sobretudo, a quantidade de obras inúteis, não produtivas de riqueza, que foram
feitas, para que depois pudesse haver ganhos dos amigos.
Tais como?
- O excesso de auto-estradas, a Expo, o Centro Cultural de Belém, o
novo Museu dos Coches, os estádios de futebol... Uma quantidade de obras que
não faziam falta nenhuma. Sempre protestei contra isso, mas até a Santa Madre
Igreja caiu nesse erro: construiu aquele monstro no Santuário de Fátima ou a
Igreja de Marco de Canavezes, quando o dinheiro podia ser muito mais bem
utilizado para os fins próprios da Igreja. É como o Estado! Tem de nos esfolar
todos em impostos excessivos para pagar os desvarios que foram feitos.
Se tivesse hipótese de reinar, o que
faria de diferente?
- O que o Estado tem de fazer é ver onde há despesas que não são
necessárias, onde há funcionários que seria melhor reciclar para um trabalho
mais útil porque se calhar estão a mais...
Se tínhamos 200 mil funcionários em 1974 hoje temos 700 mil. Certamente
que há gente a mais. O Estado teria que encorajar directamente a produção,
todos aqueles portugueses que fazem coisas fantásticas, produtos bons que são
exportados para todo o mundo, mas que têm como principal dificuldade o Estado.
O Estado português tem sido sempre o grande empecilho da produtividade e da
criatividade. O tempo que demora a dar licenças, todas as dificuldades
burocráticas... Penso que uma parte da burocracia existe para justificar a existência
de tantos funcionários e organismos.
No actual Governo tem alguns
simpatizantes da Monarquia...
- Há muitos simpatizantes em todos os partidos políticos, até no
Bloco de Esquerda. Os que não são simpatizantes da Monarquia são, pelo menos,
meus simpatizantes.
Em particular, no CDS...
- Algumas sondagens feitas lá indicam que 90% dos filiados são
monárquicos. Mas no PSD e no PS também há bastantes.
Esses 90% fazem do CDS um partido
monárquico?
- Não porque a direcção não é, mas os militantes são. Mas uma
sondagem da Comissão dos 100 anos da República perguntou quem era republicano
em Portugal. 40% respondeu que não. Desses 40%, alguns serão anárquicos. Mas
quem não é anárquico nem republicano, é monárquico.
Económico, 8 de Fevereiro de 2013
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