Há vinhos que depois de abertos são como os génios das lâmpadas mágicas:
soltam-se, invadem os lugares e dominam os sentidos. O Graham's de 1952, que
servirá simbolicamente como o vinho das comemorações do Jubileu de Diamante da
rainha Isabel II, é um desses vinhos, já no limiar das sensações terrenas,
quase do outro lado das experiências místicas.
Simon Field,
Master of Wine e responsável pelas compras de uma das principais lojas de
vinhos de Londres, a Berry's Bros., provou-o e pôs-se a dissertar sobre o aroma
de "antigas bibliotecas, fogueiras outonais, distante poesia" ou
sobre o paladar "profundo e majestático, espantosamente intenso e
poderoso, soberano na sua complexidade, um elixir intemporal".
Jancis Robinson, crítica de vinhos do Financial Times e uma das vozes
mais respeitadas em todo o mundo, não foi tão longe na poesia, mas considerou-o
"muito, muito bom". Sem dúvida: este Porto sexagenário é uma
obra-prima da natureza e do tempo.
Em 1952, quando Isabel II ascendeu ao trono, os tempos eram difíceis
para o vinho do Porto. A Europa tardava em recuperar das feridas da II Guerra
Mundial. "Não havia dinheiro, não havia mercado, foi o tempo em que várias
famílias tiveram de vender as suas empresas, como os Croft ou os
Delaforce", lembra Johnny Symington, um dos administradores do grupo que é
proprietário da Graham"s. Vinhos de anos prodigiosos como 1945 ou 1947
ficavam nas caves de Gaia à espera de melhores tempos.
O 1952 da Graham"s teve de passar por essas vicissitudes. Mas por
ser tão bom, "escapou às lotações com outros vinhos, e além de operações
normais de limpeza não teve em todo este tempo mais nenhuma intervenção",
diz Symington.
O 1952 é um Colheita (vinho de uma só vindima sem lotações e envelhecido
em casco), do qual chegaram até nós cerca de seis pipas (uns 3300 litros), das
quais foram engarrafadas mil unidades para o Jubileu da rainha mais 10
jeroboams (garrafas de 4,5 litros).
Não se sabe em que momento das comemorações entrará este Colheita.
Sabe-se que o vinho do Porto continua a ser o vinho oficial dos brindes em
Buckingham. E se a rainha tiver um consultor com bom senso para a enofilia, não
deixará de ter nas cerimónias este vinho com tons âmbar, um aroma interminável
e inebriante de frutos secos e especiarias, e uma prova de boca intensa, que
deixa um rasto muito longo de sensações luxuriantes no palato.
Um Porto inesquecível, que só estará à venda em Portugal e no Reino
Unido. Não é nada barato (330 euros), mas, como pergunta Jancis Robinson,
quantos vinhos de classe mundial com 60 anos custam este preço?
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