Mudar o regime Servir Portugal

Manuel Beninger

quarta-feira, 27 de outubro de 2010

XXIII Congresso Nacional do PPM (3)

Sílvia Oliveira, no XXIII Congresso do PPM em Lisboa

MULHER RURAL E AGRICULTURA FAMILIAR

Escrever sobre desigualdades de sexo não é nada de novo, tanto as desigualdades como os seus pressupostos existiram sempre ao longo da história dos povos. O que se pretende neste documento é contribuir para uma melhor compreensão da desigualdade da mulher no mundo rural hoje, mas sem cair no facilitismo redutor das explicações feministas de anular o entendimento do restante sistema social envolvente, como é a actual pobreza e exclusão que estas mulheres rurais se vêem condenadas.

Os sinais de pobreza em Portugal estão muito associados ao mundo rural, onde existe uma privação de indicadores mínimos de conforto, onde os rendimentos são insuficientes em virtude da população rural possuir muito baixos níveis de qualificação profissional e onde são visíveis outros fenómenos de exclusão social associados aos movimentos migratórios da população rural, ao envelhecimento da mesma, às difíceis condições de concorrência do mercado cada vez mais competitivo e subjugado à disciplina comunitária, aos efeitos nefastos da politica de subsídios ao sector, à redução da produção num país, que vive à mercê de alimentos alheios, ao consumo desenfreado de recursos naturais para crescimento urbano e à concentração urbana e suburbana, onde tem crescido novos grupos de risco de pobreza e exclusão social.

Quando se fala em agricultura, facilmente afiguramos uma mulher com um semblante enrijecido pelo tempo, uma enxada gasta e apurada na mão e uma criança polvilhada de terra e queimada pelo sol.

A actualidade mostra-nos que esta imagem não está longe do que era há 50 anos atrás, onde uma forte persistência de uma economia camponesa, baseada na família, na pequena propriedade, nas técnicas rudimentares e sujeita a flutuações agravadas pelos maus anos agrícolas e pela elevada tendência de crescimento da taxa de natalidade, onde a emigração constituía um fenómeno social de compensação a uma economia deficitária e onde o principal destino dos movimentos migratórios era a Europa, resultaram na partida dos homens e na permanência das mulheres.

Este processo de “feminização” da agricultura iniciou-se na década de 80, onde a actividade agrícola assumia um cariz secundário, marginal e até desprestigiante. A mulher substituía a mão-de-obra masculina, desviada para outros sectores de actividade, através de uma sobrecarga de trabalho, dado que era a ela, que ficavam entregues o trabalho dos campos e os animais, para além do trabalho doméstico, dos filhos e muitas vezes dos familiares mais idosos.

São estas mulheres que por questões de ordem social e económica, viram na agricultura uma forma de enfrentar despesas, afastando-se por isto, da escola e do ensino e colocando de lado sonhos e ambições. Tendo sido esta fragilidade educativa e a ausência de infra-estruturas sociais e económicas - saneamento básico, creches, escolas, transporte públicos, centros de saúde, apoios sociais e técnicos -, na maioria dos casos, um factor imediato para o débil desenvolvimento da actividade agrícola enquanto negócio e para muitas das situações de pobreza e exclusão social da mulher agrícola.

A entrada de Portugal na Comunidade Europeia e a consequente abertura das fronteiras à livre circulação de pessoas, mercadorias e bens, a instituição da PAC (Política Agrícola Comum), a desertificação das aldeias do interior do país, resultado da emigração para outros países e o êxodo para as grandes cidades à procura de melhores condições de vida, o envelhecimento da população agrícola, activou o esgotamento do modelo de agricultura familiar tendo este deixado de ser, por si só, um meio de subsistência para muitas famílias portuguesas.

Neste quadro, novos desafios se impõem, estando o Partido Popular Monárquico (PPM) porventura disponível para trabalhar e incentivar a melhoria da qualidade de vida do meio rural, que está vivo e é maioritariamente feminino e contribuir naturalmente para o desenvolvimento da agricultura, no modelo de produção familiar “a única agricultura que mata a fome”, evita o êxodo rural[1] e pobreza humana.

Mas para que esta revitalização do mundo agrícola aconteça através da encorajamento à produção agrícola familiar, onde a mão-de-obra é indiscutivelmente feminina, será necessário convencer, os poderes dominantes e a sociedade em geral, de que a pequena agricultura de molde familiar, detém e continuará a deter uma parcela maioritária dos recursos produtivos, além de ocupar a maior parte dos recursos produtivos regionais, tendo também capacidade inovadora no plano tecnológico, ecologicamente adaptado às condições concretas do meio em que se encontra instalada, sendo por isso, económica e socialmente viável.

Assim, propomos a este Congresso Nacional do Partido Popular Monárquico (PPM), também ele recolocado a novos desafios de economia da aprendizagem, a tomar medidas concretas sobre a capacitação da mulher rural, e sobre o modelo de agricultura familiar, registando-se nesse sentido algumas sugestões:

  • Promover a igualdade de oportunidades entre homens e mulheres atenuando as diferenças que persistem;
  • Afamando direitos sociais e políticos que as mulheres têm na sociedade portuguesa, ainda hoje aquém de serem concretizados;
  • Cooperando socialmente para que haja um aumento da participação das mulheres na vida económica e comunitária;
  • Arrojando sobre o abandono da “competitividade” como eixo central das politicas agrícolas actuais;
  • Pressionando a manutenção/criação de serviços públicos de proximidade e de qualidade como são escolas, paternidades, urgências e transporte públicos em meios rurais;
  • Estimulando incubadoras nacionais universitárias e/ou empresariais para o empreendedorismo feminino;
  • Incentivando o movimento associativo agrícola para melhorar o apoio técnico especializado e para a criação de uma rede de conhecimento com aplicações temáticas e regionais, conjunta com universidades, institutos superiores, escolas profissionais agrícolas e municípios;
  • Contribuindo para emergência de um novo olhar sobre a ruralidade, através do incentivo à criação de redes sociais de suporte à agricultura familiar.

Em termos conclusivos, gostaríamos, ainda, de afirmar a convicção de estarmos na presença de um novo paradigma de ruralidade, assente numa agricultura de produção RAN (Reserva Agrícola Nacional) e numa agricultura de conservação REN (Reserva Ecológica Nacional), combinadas com uma problemática educacional e do “regresso à terra” ou à agricultura familiar, como alternativa aos caos social e económico da sociedade imperante e à produção de bens e serviços que garantam o desenvolvimento e sustentabilidade humana.Para finalizar desafiaríamos este Congresso, com as seguintes questões:

Para finalizar desafiaríamos este Congresso, com as seguintes questões:

Estarão as políticas públicas agrícolas e o nosso sistema educativo a funcionar em condições de nos preparar para prosseguirmos este caminho?

Se, sim:

Como assegurar a viabilidade económica e a sustentabilidade agrícola e ecológica?

Como conciliar os elevados padrões de qualidade e segurança alimentar?

Como garantir que a PAC (Politica Agrícola Comum) permaneça como uma verdadeira politica agrícola capaz de responder à enorme diversidade dos agricultores e dos territórios rurais portugueses?

E, ainda como uma exaltação à “Mulher Pobre e Excluída”, perguntamos se:

HAVERÁ MELHOR SUSTENTABILIDADE NO MUNDO DO QUE AQUELA QUE A MULHER OFERECE À HUMANIDADE ATRAVÉS DOS FILHOS QUE A IMORTALIZAM?

Sílvia Oliveira

[1] Boaventura Sousa Santos, In “Público” de 1 de Fevereiro de 2009.